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Análise dos dados da pesquisa Origem/ Destino de Campo Grande - MS


Por: Eric Moises

Como prometido em um dos últimos textos do blog (https://ligadosnotransportecg.blogspot.com/2018/10/pesquisa-origem-destino-de-campo-grande.html), faremos uma análise dos dados que tivemos acesso através da pesquisa encomendada pelo Consórcio Guaicurus sobre os deslocamentos feitos pela população da cidade. Nessa primeira parte avaliaremos a maneira como se desloca e o perfil de quem se desloca em Campo Grande. Na segunda parte, que deverá ser disponibilizada em breve, avaliaremos de onde as pessoas saem e para onde elas vão.

Forma de deslocamento
Campo Grande (2017)
Modo principal
Modo
Viagens/ Dia
%
Não motorizado
-
567.543
39,6%
Coletivo
Ônibus Municipal
312.565
21,8%
Outro
11.614
0,8%
Individual privado
-
524.318
36,6%
Individual público
-
14.692
1,0%
Outros
-
2.032
0,1%
Total
-
1.432.764
100,00%

População 2017: 853.098
Mobilidade geral (viagens/Habitante.dia): 1,68

Esses dados foram obtidos por meio de pesquisa amostral e mostra a forma de deslocamento usual do campo-grandense. Nota-se que a maioria das viagens realizadas na cidade se dão por meio individual (37,6%)  em relação ao coletivo (22,6%).  Os valores ressaltam o que há anos é discutido pelos maiores especialistas em urbanismo, as cidades brasileiras estão ocupadas por carros, que ocupam muito espaço e transportam pouca gente comparado ao transporte coletivo, ocasionando lentidão nos deslocamentos. Não seria nenhum exagero dizer que mais de 90% do espaço nas vias de Campo Grande são ocupadas pelo transporte individual.  É um problema nacional, que envolve desde a cultura do brasileiro de valorização do automóvel até incentivos governamentais ao transporte individual e que evidencia a necessidade do governo começar a tomar medidas de priorização do transporte coletivo. 

Avaliando especificamente os dados para Campo Grande, infelizmente a pesquisa não discrimina automóveis de motocicletas. As motocicletas são alternativas de baixo custo e amplamente adotadas em Campo Grande como opção ao transporte público lento e desconfortável, porém esse crescimento do número de motocicletas se tornou um problema de saúde pública devido aos constantes acidentes de alta gravidade. Acreditamos que boa parte da diminuição do número de usuários no nosso sistema de transporte público ocorreu devido a migração para motocicleta. Um número importante a se ressaltar é o 1,0% de deslocamento realizado pelo transporte individual público que se deve principalmente à consolidação de aplicativos como Uber. 2017 foi o ano de consolidação do aplicativo em Campo Grande e a tendência é que essa forma de viagem continue crescendo, se tornando mais um mecanismo de fuga dos passageiros do sistema de transporte coletivo.

Motivo da viagem

Motivo
Por Modo Principal
Coletivo
Individual
Não motorizado
Total
1. Trabalho/ Transporte
38,1%
46,4%
23,1%
36,2%
2. Estudo/ Transporte
24,9%
24,0%
62,5%
36,4%
3. Outros
37,0%
29,6%
14,4%
27,4%
Total
100,00%
100,00%
100,00%
100,00%

A tabela acima, montada também a partir da pesquisa amostral, mostra os motivos pelos quais as pessoas se deslocam em Campo Grande. 

Um ponto importante a se notar é que "estudos" é hoje o maior motivo de deslocamento da cidade, um reflexo de uma população ainda muito jovem. Observando mais atentamente os deslocamentos devido a estudos, nota-se que a maioria deles ocorre por meio não motorizado, uma grande evidência de que boa parte dos estudantes moram perto de suas escolas, se deslocando a pé ou de bicicleta. É importante ressaltar isso, pois em diversas audiências públicas já foi alegado até mesmo por vereadores que os estudantes saturam o sistema de transporte público por buscarem escolas longe de onde moram, um fato que além de inverídico atenta contra a liberdade de escolha desses. A parcela de estudantes usando transporte coletivo é bem significativa, mas é importante ressaltar que boa parte são os estudantes mais velhos de ensino médio e superior cujas escolas encontram-se afastadas dos bairros. 

Outro ponto interessante desses dados é notarmos que mais de 1/3 dos deslocamento por transporte coletivo encontra-se no motivo "outros", que inclui viagens por motivo de lazer, compras e serviços (consultas médicas por exemplo).  As linhas de Campo Grande são em grande parte planejadas em cima de lugares geradores de emprego e de escolas, mas esses dados mostram a importância de se estudar outros pontos geradores de demanda, como posto de saúde e comércio local (de bairro).

Mobilidade e Renda

Classe
Não motorizado
Coletivo
Individual
Total
A
0,67
0,19
0,97
1,83
B1
0,71
0,20
0,94
1,85
B2
0,56
0,30
0,85
1,71
C1
0,60
0,38
0,65
1,63
C2
0,67
0,34
0,59
1,60
D/E
0,75
0,36
0,55
1,66
Total
0,66
0,38
0,64
1,68

Os dados acima mostram a média de quantas viagens são feitas pelas pessoas de diferentes classes sociais. Alguns pontos interessantes a se destacar é que mesmo nas classes mais baixas, as pessoas andam menos de transporte coletivo que individual, um efeito da política adotada nas últimas décadas pelo governo federal de incentivo ao transporte individual e também uma confirmação do que foi dito acima da constante troca que as pessoas fazem do ônibus pela motocicleta, já que ambos acabam tendo custos semelhantes. 

Analisando os números do transporte coletivo, a classe campeã é a C e a classe B apresenta também números significativos, uma evidência de que os ônibus da cidade atendem sim um público mais exigente e com grande tendência de migrar para os serviços de aplicativos como Uber. Ou seja, as empresas de ônibus devem sim melhorar a qualidade de serviços prestado, pois atendem consumidores que não necessariamente utilizam os serviços de ônibus por ser a única opção de deslocamento (característica que seria mais evidente nas classes D e E).  

Mobilidade e idade

Faixa
Não motorizado
Coletivo
Individual
Total
Até 9
0,94
0,12
0,97
2,03
10 a 19
1,05
0,34
0,94
2,33
20 a 29
0,54
0,44
0,85
1,83
30 a 39
0,52
0,37
0,65
1,54
40 a 49
0,48
0,36
0,59
1,43
50 a 59
0,51
0,37
0,55
1,43
60 e mais
0,29
0,42
0,31
1,02
Total
0,66
0,38
0,64
1,68

A tabela acima mostra a média de viagens realizadas conforme a faixa etária. Uma informação relevante é o fato de transporte coletivo só levar vantagem sobre o individual na faixa de 60 mais, que abrange a gratuidade no uso de ônibus. Um ponto interessante é percebemos que os jovens são as pessoas que mais se locomovem como um todo na cidade, o que evidencia que o uso de tecnologias, como aplicativos indicando  o horário que os ônibus devem passar no ponto ou que permita a recarga do cartão, deve ser bem aceito por uma boa faixa dos usuários de ônibus e um incentivo para atrair mais gente para o sistema. 

Mobilidade e instrução

Grau
Não motorizado
Coletivo
Individual
Total
Analfabeto
0,40
0,41
0,49
1,30
Pré-escolar
0,99
0,18
0,41
1,58
Fund (5º Ano)
0,84
0,30
0,56
1,70
Fund (9º Ano)
0,76
0,36
0,49
1,61
Médio
0,55
0,38
0,86
1,79
Superior
0,20
0,25
1,39
1,84
Outros
0,30
0,07
1,00
1,37
Total
0,66
0,38
0,64
1,68

Os dados acima mostra uma relação até esperada para a cultura predominante do Brasil, notamos que quanto maior o grau de instrução, maior o uso de transporte individual, já que os automóveis estão no imaginário popular como um símbolo de conquista e status. Outro ponto interessante é que o maior grau de instrução também leva a mais deslocamentos diários. Nesse ponto seria necessário um trabalho de longo prazo de incentivo ao transporte público, que deveria começar com as prefeituras priorizando o espaço público para ônibus ao invés de automóveis, coisa que está muito longe de ocorrer em Campo Grande.  

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