Na segunda parte das análises dos dados da pesquisa
Origem / Destino encomendada pelo Consórcio Guaicurus, focaremos na origem
destino propriamente dita, ou seja, de onde para onde as pessoas se movem na
cidade. Essas informações seriam muito úteis para o replanejamento das linhas
de ônibus da cidade, mas como dito nas análises anteriores, o relatório traz
números com pouquíssimas análises em cima deles. Nesse texto tentamos
simplificar ou pelo menos trabalhar esses números de forma diferente para obter
mais informações.
Foto na formatação original de uma das tabelas presente na pesquisa e apresentada nessa análise. |
A cidade foi dividida em nove regiões, numerada na
pesquisa da seguinte forma:
1 - Centro: que inclui os bairros Amambaí,
Bela Vista, Cabreúva, Carvalho, Centro, Cruzeiro, Glória, Itanhangá, Jardim dos
Estados, Monte Líbano, Planalto, São Bento e São Francisco.
2 - Segredo (região norte): que inclui os
bairros Coronel Antonino, José Abraão, Mata do Segredo, Monte Castelo, Nasser,
Nova Lima e Seminário.
3 - Prosa
(região nordeste/ leste): que inclui os bairros Autonomista,
Carandá, Chácara Cachoeira, Chácara dos Poderes, Estrela Dalva, Margarida, Mata
do Jacinto, Noroeste, Novos Estados, Santa Fé e Veraneio.
4 - Bandeira (região sudeste): que inclui os
bairros Carlota, Dr. Albuquerque, Jardim Paulista, Maria Aparecida Pedrossian,
Moreninha, Rita Vieira, São Lourenço, Tiradentes, Tv Morena, Universitário e
Vilasboas.
5 - Anhanduizinho (região sul): que inclui os bairros Aero Rancho, Alves Pereira, América, Centenário,
Centro-Oeste, Guanandi, Jacy, Jockey Club, Lageado, Los Angeles, Parati, Pioneiros,
Piratininga e Taquarussú.
6 - Lagoa
(região sudoeste): que inclui os bairros Bandeirantes, Batistão,
Caiçara, Caiobá, Coophavila II, Leblon, São Conrado, Tarumã, Taveirópolis,
Tijuca e União.
7 - Imbirussú
(região oeste): que inclui os bairros Nova Campo Grande, Núcleo
Industrial, Panamá, Popular, Santo Amaro, Santo Antônio e Sobrinho.
8 - Distrito
de Anhanduí
9 - Distrito
de Rochedinho
Mapa de Campo Grande dividido em suas regiões, sem os distritos de Anhaduí e Rochedinho. |
Matriz
Origem Destino - Motivo Residência
A seguir temos dados obtidos a partir da pesquisa
amostral feita de residência em residência. O "Motivo Residência"
representa todas as vezes que os entrevistados voltam para casa ao longo de
24h, ou seja, o destino representa a
localização de sua residência. As tabelas a seguir, com formatações alteradas
em relação as originais para ficarem de entendimento mais fácil, traz os
números previstos de deslocamentos por transporte público e individual.
São 160.792 deslocamentos feitos de ônibus contra
247.919 por meios individuais, desconsiderando os deslocamentos feitos por meios
não motorizados e por transporte público individual, os ônibus estão perdendo
de 39,3% a 60,7% para carros e motos, por motivos já discutidos nas análises
anteriores. Apesar da esmagadora derrota, temos alguns casos a destacar, como
por exemplo o fato de mais gente se deslocarem das regiões Bandeira e
Anhanduizinho pro centro de ônibus do que de carro/moto, uns dos raríssimos
casos de vantagem para o transporte público.
Outra forma de avaliar esses dados é comparar a
proporção dos deslocamentos feitos com a população de cada região. Porém essa
análise tem a limitação de o último censo ter sido realizado em 2010. Em uma cidade
como Campo Grande, que se expande constantemente e que inaugurou diversos
conjuntos habitacionais nas periferias nesse período, a análise fica um pouco
comprometida.
Esses dados nos mostra que em geral, a porcentagem
de pessoas utilizando transporte individual é muito semelhante a porcentagem da
população, com todas as diferenças abaixo de 3%. O mesmo não ocorre com ônibus,
sendo que duas regiões se destacam com um uso de coletivo proporcionalmente
maior que a população (Anhaduizinho e Bandeira), enquanto outras se destacam
negativamente nesse sentido (Segredo, Lagoa e principalmente o Centro). É
possível interpretar essas variações baseadas na variedade de poder aquisitivo
das regiões, sendo a região Centro de maior poder aquisitivo e Anhaduizinho de
menor poder aquisitivo, porém era esperado que essa variação se refletisse
tanto no transporte público como no individual, mas na prática o reflexo no
transporte individual é pequeno. Outra possível explicação seria no atendimento
de ônibus que as regiões recebem, a região centro por exemplo, possui quase
toda sua parte residencial pessimamente atendida por ônibus, com poucos veículos
circulando e/ou trajetos que passam por uma única via na borda do bairro. Já o
Anhanduizinho é cercada por 4 terminais (Morenão, Guaicurus, Bandeirantes e
Aero Rancho), todos eles com linhas bem relevantes para a região.
Nesse caso
caímos no impasse: as regiões que mais transportam passageiros assim o fazem
porque são melhor atendidas ou são melhor atendidas porque transportam mais
gente?
Pra tentar extrair ainda mais informação, montamos
a tabela com a porcentagem de deslocamento de cada região:
Nessa tabela, é apresentada a porcentagem de onde
provém as pessoas que moram em determinada região. Por exemplo, 50,44% das
pessoas que moram na região segredo e usam ônibus provém do Centro, enquanto
19,01% vem da própria região Segredo, 10,51% da região Prosa e assim por
diante. Os dados seguem a tendência
esperada, em que a maior parte dos deslocamentos provém do centro, maior polo
gerador de trabalho. Porém é bem relevante destacar os deslocamentos internos (dentro
da própria região, destacados em verde). Na maioria das regiões o deslocamento
interno é o segundo maior e no caso do Imbirussú supera até mesmo os
deslocamentos proveniente do centro. Esse número é muito relevante, pois mesmo
concorrendo fortemente com os deslocamentos não motorizados (a pé e bicicleta),
muita gente usa ônibus pra se mover dentro da própria região. Esse dado embasa
uma antiga briga da equipe do Ligados no
Transporte com o Consórcio Guaicurus, a liberação de integração temporal independente
das linhas utilizadas. Hoje você só pode pegar um segundo ônibus sem pagar a
segunda passagem se utilizar linhas de regiões diferentes, porém, para
deslocamentos internos, seria muito mais vantajoso trocar de ônibus na rua do
que ir até o terminal ou completar o trajeto a pé.
A tabela acima mostra a porcentagem de deslocamento
entre regiões utilizando transporte individual. Uma evidência interessante a se
observar é que todos os deslocamentos "centro -> outra região da cidade"
tem um peso menor em relação ao total de deslocamentos quando feito de
carro/moto do que quando feito por ônibus (comparação entre as primeiras linhas
de ambas as tabelas). Podemos concluir que os deslocamentos de carro/moto são
mais bem distribuídos na cidade, enquanto os de ônibus se concentram mais para
o centro. Isso é uma consequência de um sistema de transporte que privilegia
demais o centro e dá pouquíssima importância aos deslocamento bairro-bairro,
como já ressaltado inúmeras vezes aqui no blog e evidenciado pelo baixíssimo
número de linhas interbairros da cidade. Dessa forma, esse deslocamento
bairro-bairro, que teve a importância aumentada no últimos anos, são mais
complicados de serem feitos de ônibus, estimulando que as pessoas busquem cada
vez mais os meios de transporte de individual, principalmente as motos. A falta
de integração temporal livre entre linhas também dificulta esse deslocamento,
principalmente quando feito entre regiões vizinhas, já que para o Consórcio, Anhanduizinho
e Bandeira, por exemplo, são da mesma região por serem atendidos pelos mesmo
terminais (Morenão e Guaicurus).
Os dados a seguir referem-se aos deslocamentos por
meio não motorizados (a pé e de bicicleta)
Os não motorizados, como era de se esperar,
concentra-se bastante nos deslocamentos interno (de uma região para a mesma
região), pois são os deslocamentos de menor distância, feito principalmente por
estudantes mais novos. É também
relevante, apesar de ter números bem menores, os deslocamentos entre regiões
vizinhas.
E por fim, os números do transporte público
individual (táxi, uber e etc.)
Na época em que foi feito a pesquisa, esse tipo de
transporte ainda vinha se consolidando e tinha uma importância muito pequena
(1,1% do total de viagens), sendo esses números pouco relevantes nessa análise. Mas vale ressaltar que a
participação desse meio de locomoção tem aumentado e muito em curto período de
tempo. Apesar da análise estar comprometida pelo baixo número de viagens, um
ponto interessante a se analisar é o imenso número de viagens internas na
região Anhanduizinho, sendo 1225 viagens em um total de 7923 viagens, ou seja,
15,4% de todas as viagens feitas pelo transporte individual público. Esse dado
é interessante, pois mesmo sendo a região de menor poder aquisitivo da cidade,
muito moradores estão pagando por seus curtos deslocamentos valores mais altos
do que os cobrados nas tarifas de ônibus, ou seja, mesmo com menor poder
aquisitivo, as pessoas estão dispostas a pagar mais quando o serviço é de
melhor qualidade.
Nas imagens a seguir temos as análises referente as
esses dados que constam no relatório.
Nesse caso temos um diagnóstico correto a respeito
de uma das principais reclamações dos usuários de ônibus de Campo Grande,
principalmente os que utilizam terminais, a demora para pegar a linha no bairro
e o desconforto no terminal e principalmente nas lotadas linhas troncais. O
sistema radiocêntrico citado pressupõe linhas rápidas no bairro e veículos
maiores nas linhas troncais, pois essas concentram a demanda de vários bairros
juntos, porém o movimento feito pelo Consórcio Guaicurus tem sido exatamente o
contrário, com as linhas troncais rodando com veículos do mesmo porte das
linhas alimentadoras, gerando desconforto e lotação. A ineficiência da
prefeitura em construir novos terminais e replanejar as linhas da cidade também
contribui para que as linhas de bairros sejam demoradas e realizem muitas
voltas antes de chegar ao seu destino.
Essa análise feita pelos escritórios contratados
falha em só citar o deslocamento centro - bairro, sem discutir, como feito em
nossa análise, o motivo dos deslocamentos interbairros serem tão pouco feitos
de ônibus se comparado com transporte individual.
Essa segunda e última parte da análise dos dados
feitas pelos pesquisadores trata de um ponto discutido aqui também, o
atendimento ruim dos ônibus no centro. Os ônibus na região central concentram
seu atendimento em uma pequena parte dela, sendo que os bairros ao redor possui
um atendimento muito ruim, o que desincentiva o uso de transporte público para
o centro, apesar de nosso sistema de linhas focar justamente nessa região.
E assim a gente encerra a segunda parte da análise
desses dados. Em breve traremos uma terceira e última parte para encerrar essa
série.
Link para as postagens das análises anteriores:
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